30 de Abril de 1918
Algures em França,
Terminou ontem uma das batalhas mais mortíferas, até agora. Descobri
hoje pelos meus camaradas que se chamou batalha de La Lys.
Quase ainda nem consigo abrir os olhos com medo de enfrentar e de
rever as imagens dos últimos 20 dias... foi atroz... um enorme banho de sangue
e o meu amigo, o meu camarada Zé António, perdeu a vida no dia 17. Pela
primeira vez nesta guerra senti-me sem forças para prosseguir.
Era suposto sermos rendidos no dia 8, no dia anterior ao começo deste
enorme prélio, que deitou por terra, provavelmente, mais de 500 homens valentes
da nossa nação.
Acordo todas as noites debaixo de fogo a chorar incessantemente com os
nervos à flor da pele, soluçando como uma criança, sonhando com os homens
derramados por estes campos ensanguentados. A guerra está a deteriorar o meu
foro psicológico, estou sem moral, sinto-me morto mesmo estando vivo.
Não gosto do que vejo, fico arrepiado com as explosões de granadas que
rompem as trincheiras e os céus , porém todas as pátrias têm sido solidárias
e a entreajuda reina nos escassos tempos
de paz! É bom ver campas dos nossos homens em dialetos estrangeiros, acima de
tudo a humildade ainda não desvaneceu, porque nós todos sofremos por igual e os
sentimentos de medo e trauma por todos são partilhados.
Até um dia...
Margarida Rodrigues
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